terça-feira, 9 de abril de 2013

O NORTE FLUMINENSE - 10-2007



UMA CANECA DE CAFÉ COADO
                                                                              Neumar Monteiro

                                   O aroma de café torrado, aquele perfume reconfortante que nos enche de satisfação, um sentido de reunião e de aconchego familiar. Toda a casa envolvida nos afazeres domésticos de torrar os grãos do café no fogão a lenha e depois moê-lo no velho moinho da vovó; após, guardá-lo na antiga e descascada lata de biscoito ou num pote grande de vidro adquirido no Empório do Zanon.
                                   Os grãos, comprados e anotados na caderneta do armazém do José Bastos, eram quitados mensalmente junto a outros produtos usados no dia a dia. O café arábica tradicional e o gourmet faziam sucesso nos lares. Beber um cafezinho recém coado amolece o coração; servi-lo quentinho às visitas abranda qualquer conversa e desfaz as tensões que, por acaso, pairam no ambiente. É chique e elegante. Merece destaque que em 1952 foi criado o Instituto brasileiro do Café (IBC), formado por cafeicultores, que definiu as diretrizes da política cafeeira até 1989.
                                   O fogão recebia várias camadas de barro branco para ficar bonito como os donos queriam ou cal virgem misturado com água. Em cima do fogão ficava o ferro de passar carregado com brasas incandescentes, quando ainda não existia o ferro elétrico. Naquele tempo eram escassas as lojas que vendiam roupas prontas, também o dinheiro era difícil, e as camisas, fraldas do bebê e os vestidos eram costurados na máquina Singer tocada à mão. O rádio era a válvula, Philips, Philco, Semp ou Telefunken, os mais comuns, com antena na cumeeira da casa e transmitindo as notícias em meio a previsíveis chiados.
                                   Passear pelas ruas de Bom Jesus era apreciar simultaneamente vários estilos arquitetônicos que iam das residências pequenas e singelas que se espalhavam por toda área urbana e rural do município, ao colonial, enxaimel, neoclássico, art-deco, barroco, rococó e art-nouveau, naquele amálgama que os historiadores denominam ecletismo.  Casas que há muito foram derrubadas para desprazer daqueles que sabiam valorizá-las. Hoje só resta uma pequena amostra daquilo que um dia foi arte e encantamento.
                                   Residências e prédios públicos com acabamento de frisas com desenhos sinuosos; frontões, alpendres, relevos e adereços como guirlandas e desenhos geométricos moldados com gesso e pintados a mão, fora e dentro das casas. Era ainda comum encontrar no interior das residências objetos e documentos que lembravam a terra de origem dos ancestrais: fotografias, cadernos de receitas centenárias, discos de vinil, filmes antigos, livros e objetos de uso domiciliar como gramofone, piano, máquina de costura com gabinete de madeira e relógios de parede. Tudo perdido conforme o esvair do tempo. Pena que nunca tivemos um museu para abrigar essas raridades.
                                   O ontem e o hoje... Como será o amanhã? O muito que perdemos, ganhamos em modernismo. Só o tempo, o eterno divisor de águas, apontará o que realmente foi lucro ou prejuízo.       


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