quarta-feira, 6 de janeiro de 2021

CRÔNICAS & ARTIGOS

 

SE A CANOA NÃO VIRAR  - NF  03 - 2009

                                                                                                            Neumar Monteiro

                                                                             (eumarmonteiro.blogspot.com)

 

                                      A grande surpresa de 2009: as marchinhas de carnaval voltaram! A novidade foi anunciada com alegria, já que as marchas sempre foram instrumentos de protestos políticos, chacotas e reivindicações populares. Toda implicância levava ao personagem e o povo sabia disso; não havia quem se livrasse da “Mamãe eu quero mamar”, “A Maria ta”, “Sassaricando”, “Lata d´água na cabeça” , “Me dá um dinheiro aí”, “Quero chorar” e tantas outras que alertavam os governantes das necessidades de um povo sofrido sob o comando autoritário de uma chefia impopular.

                                               Na verdade as marchas eram o que de melhor havia nos carnavais passados justamente pelo valor democrático que permitia a cobrança, dizendo, na boca da folia, que alguma coisa ia muito mal; sem dúvida, mais eficientes que o voto popular que pode ser comprado.

                                               A canoa que vira é a própria vida e as coisas passageiras que dela desfrutamos. Quem pensa que o dia de maré mansa perdura para sempre pode tirar o cavalinho da chuva, porque sempre haverá a inclemência do sol. Um minuto de esperança pode ser véspera de um amanhã sombrio. Por que tantas controvérsias abaixo do céu?

                                               A canoa vira quando mostramos a face tenebrosa da maldade camuflada no sorriso falso e lisonjeiro da mentira; quando, constituídos em autoridade, prejudicamos o próximo perseguindo e caluniando; quando, podendo fazer o bem, escolhemos a omissão.

                                               Tanta sabedoria nas ingênuas modas carnavalescas! Quando foi que calamos o protesto, engolimos sapos e deixamos avermelhar a cara sem vergonha? Quando foi que colocamos à deriva a canoa da nossa vida? Não é desilusão de início de ano… É algo maior que vem sendo esquecido dentro de nós: como a incapacidade de lutar pelos nossos direitos ou a apatia de não agir.

                                               Se a canoa não virar, não mudamos. O futuro precisa de carnavais com marchas, de povo sem máscara, de vida com graça, esquecer da cachaça, evitar a desgraça e limpar a vidraça para que os olhos possam vislumbrar um novo amanhã. E, saudosamente, concluímos: “eu mato quem roubou minha cueca pra fazer pano de prato!” Até isso passaram a mão.

Nenhum comentário:

Postar um comentário